sábado, 4 de fevereiro de 2012
Deus Ex Machina
domingo, 29 de janeiro de 2012
Oferenda

Aquele era um clube noturno novo, cujos segredos eu ainda descobria. Naquela ocasião, a bebida exagerada havia me enchido de ousadia. Culpo essa situação pela minha atitude ao ver o sujeito falando com a garota que parecia estar na fronteira entre o pânico e a entrega.
sábado, 21 de janeiro de 2012
Curupira

Curupira atualmente trabalharia pro IBAMA, brincou certa vez um amigo meu que costumava bancar o folclorista espirituoso. Mal sabia ele que tal afirmação escarnecedora não poderia estar mais longe da natureza do Curupira. Ele não é um protetor das florestas. É verdade que seu rastro confunde os caçadores, mas isso não é proposital, apenas consequência das bebedeiras constantes que toma devido a seu temperamento.
sábado, 14 de janeiro de 2012
Sertão do aço

- Cangaço.
O homem levantou abruptamente e fez sinal para a mulher permanecer sentada. Seu olhar dizia que resolveria tudo. Em seguida caminhou até a estrada, e esperou o grupo de cangaceiros de aço chegar.
Eram poucos, mas isso não aliviou a tensão do homem; esse tipo de gente era sempre perigoso, estando em bando ou sozinhos. Vários deles tinham implantes mecânicos, principalmente braços e pernas. O homem que à frente acenou com a mão e o grupo parou; tinha esferas vermelhas no lugar dos olhos e um implante substituindo o maxilar, dando-lhe o aspecto de uma caveira de metal.
- Precisamos de um lugar pra passar a noite, disse.
- Temos um lugar, mas não mais do que isso, respondeu o homem. Falta tudo o mais pra nós.
- Não precisamos mais que isso, além do silêncio. Temos macacos no rastro.
O homem acenou, indicando que o seguissem. Colocou-os num estábulo velho, há muito tempo vazio. Depois foi para casa, trancando sua família lá dentro, ordenando silêncio e rezando para que ele permanecesse em todo canto.
O grupo partiu ao amanhecer. O homem agradeceu, não a eles, mas à sorte deles terem deixado apenas as mesmas desgraças que encontraram. A mulher, contudo, não parecia tão satisfeita, e olhando o grupo com desprezo comentou:
- Olhe pra’quilo. Aquelas coisas no corpo, na cara, aberrações. Aquilo ali já não é mais gente.
O homem olhou para o grupo, para a esposa e para a casa, tristemente. Talvez o bando não fosse mais gente mesmo; mas isso ao menos significava que alguma vez o fora. E eles, vivendo naquela miséria, esquecidos por Deus, o que eles eram?
sexta-feira, 6 de janeiro de 2012
quarta-feira, 28 de dezembro de 2011
O outro lado
Saci
Esses dias me lembrei da vez em que conheci um saci.
Isso foi na adolescência, quando costumava viajar pelo interior com meus pais. Em um cidadezinha, cujo nome não recordo, notei que um ponto de referência constante era a “casa do saci”. Curioso, perguntei o porquê do apelido; os matutos riram e disseram não era apelido, que ali tinha saci mesmo.
Numa manhã de ócio saí para ver o tal Saci. No local indicado encontrei uma casa tipicamente interiorana, emendada nas outras, com uma varandinha na frente, onde estava sentado numa cadeira de balanço um senhor negro um tanto velho, fumando um cachimbo malcheiroso. Trazia um boné vermelho na cabeça, e, pela falta de volume do lado esquerdo da calça, percebia-se uma perna faltando. Parecia de muito mau humor.
Consegui conversar um tempo com ele. Disse que era mesmo um saci, desses moleques e traquinas, mas que depois de perder sua função no mundo teve de vir pra cidade. Perguntei, inocente, se era porque ninguém acreditava mais no Saci. O velho achou graça na pergunta, respondendo ironicamente:
- Pouco importa se vocês acreditam ou não na gente; a gente tá aqui somente pra fazer desordem e bagunça. Acontece que vocês arrumaram formas muito mais eficientes pra tornar o mundo mais caótico; e, o pior, de forma bem ordeira. Não vi mais razão continuar dando nó em rabo de cavalo e arrumei um emprego, como todo mundo. Hoje sou aposentado pelo INSS.
Foi uma visita realmente frustrante, mas ainda assim pedi para tirar uma foto minha com o saci. Em pouco tempo esqueci completamente aquele episódio; tanto que, quando olhava os antigos álbuns da família, demorei bastante tempo para me lembrar por que eu tinha uma foto com aquele idoso militante do MST.