segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Representação

A forma como ela entrou definitivamente no círculo importante do mundo das artes plásticas foi através da sua técnica da “pintura da realidade”. Não se sabia muito bem como, mas com pincéis e tintas aparentemente comuns, ela era capaz de pintar não telas que se configuravam como cópias perfeitas do mundo real, mas o mundo real em si.

Obviamente, seu sucesso inicial foi estrondoso. Todos queriam comprar suas telas, ou, como na verdade eram chamados, seus “objetos”. Deu inúmeras palestras e conferências ao redor do mundo, expôs nas galerias mais importantes da época, reuniu vários seguidores, discípulos, simpatizantes. A crítica especializada (e a não-especializada, embora de maneira mais simplória/menos elitista, dependendo de quem via) falava em uma “efetiva superação do modelo platônico”, num “meta-realismo”, em “anti-mímesis”. Ouviu-se em vários momentos a palavra “revolução”, mais ainda a palavra “fama”, mas foi a palavra “dinheiro”, embora pronunciada poucas vezes, que teve o maior papel nesses acontecimentos.

A revolução, contudo, não veio, e sua obra logo se tornou datada. Atualmente poucas pessoas ouviram falar nela, e, embora sua arte ainda esteja presente nos museus, nem mesmo os poucos especialistas em sua obra são capazes de não confundi-la com as demais peças do resto do acervo arqueológico.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Menino Deus

Quando Deus morreu, muitos quiseram participar do funeral, alguns para prestar sua homenagem e deixar transparecer a dor pela perda do Pai de todos nós, e outros para se certificar de que o déspota cruel e arbitrário havia realmente batido as botas e deixado a humanidade em paz.

Mas foi uma enorme surpresa para todos, fiéis e infiéis, quando, ao chegarem próximos ao caixão no qual jazia o Criador e darem um boa olhada lá dentro, perceberem que Deus, na verdade, não passava de um garotinho, desses que, mortos e com os olhos fechados, costuma-se dizer que se parecem, aqui não sem um certa ironia, com “anjinhos”.

No fim, ambos os grupos, fieis e infiéis, saíram de lá, por assim dizer, na falta de uma palavra melhor, “vazios”. Nem tanto por terem descoberto, no caso dos primeiros, de que no fim das contas nunca houve ninguém que estivesse realmente cuidando deles, e no caso dos segundos, que a culpa de todos os males do mundo não pertencia efetivamente a ninguém senão a eles mesmos, mas sim porque a morte de uma criança, seja ela um Ser supremo ou a mais comum e vulgar de todas, sempre abre uma ferida no mundo, que nada nem ninguém é capaz de curar.