Já faz algum tempo que o recebi
por e-mail de alguma amizade ou ex-amizade; não me lembro bem. Sei que, como a
mensagem parecia confiável, deixei-o entrar, e só o percebi quando era tarde.
Quando me dei conta, tentei deletá-lo imediatamente; mas fui surpreendido com
seu apelo de que não o matasse.
Aquilo, como não poderia deixar de ser, me comoveu; e é por isso que ele até
hoje está aqui.
Seu humor reúne aqueles três atributos
que, combinados, tornam qualquer um insuportável: ironia, sarcasmo e cinismo. Mas, talvez
devido a sua dimensão (tem só alguns bytes), eu geralmente o acho divertido; ele
me lembra Woody Allen.
Sua brincadeira favorita é a
ameaça, e gosta de dizer que vai “escancarar minha privacidade”. Não sou uma
pessoa de segredos, mas não gosto que leiam minha literatura (acho-a muito
ruim). Quando ele se aproxima da pasta “Obras”, faço cara feia e ele recua
deixando escapar um sorrisinho que é como um lag, e que me faz estremecer.
Pensei em chamá-lo Odradek, mas
depois percebi que seria despropositado. Não o chamo nada e ele vem quando
quer.
Três ou quatro vezes sonhei que
ele escapava da tela e vinha até meu quarto onde eu, efetivamente, dormia.
Carregava, de alguma forma, uma faca. Ou talvez fosse um estilete. Não me fazia
mal, mas me espiava por horas a fio, respirando calmamente, como quem observa a
paisagem correndo pela janela de um trem.
Sei que é mau e que me odeia; no
fundo, também o detesto. Mas o suporto por saber que posso me livrar dele
quando quiser. Ele também tem consciência desse fato, mas, desde seu apelo
inicial, não tocamos no assunto. Pergunto-me se essa situação é certa. Mas sei que é a única forma para
que ambos possamos continuar existindo.
Achei esse um dos melhores =)
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